Resenhas

Disco Doom – Numerals

Dupla Suiça cria bela experiência musical que passeia criativamente por sensações de amor e desespero

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Ano: 2014
Selo: Exploding In Sound
# Faixas: 12
Estilos: Indie Rock, Noise Rock, Rock Experimental
Duração: 33:43
Nota: 4.0
Produção: Jim Roth
SoundCloud: Dupla Suiça cria bela experiência musical que passeia criativamente por sensações de amor e desespero

Numerals, terceiro disco da banda suiça Disco Doom, apresenta uma alternativa criativa de como produzir um disco que utiliza referências do passado sem soar como somente um resgate de um estilo, mas compreende as características que conseguem traduzir melhor sua arte e reinventam tudo isso em um som belo e tecnicamente impecável, ainda que às vezes indecifrável.

Muitos podem não conhecer, mas a banda foi formada em 1996, em Zurique, e desde lá vem convivendo com a primeira linha do Indie e Noise Rock mundial, saindo em turnê com Dinosaur Jr., Sebadoh, Built To Spill e outras, mas tem absorvido muito mais a qualidade de todos eles do que sua popularidade. Gabriele De Mario e Anita Rufer comandam o pouco conhecido projeto que é bem baseado na guitarra, mas a utiliza de maneiras inusitadas, mesclando elementos familiares do estilo com muita criatividade sob a produção de Jim Roth, do Built To Spill.

Numerals é a trilha sonora de um período que mistura amor e desespero. A maneira mais fácil de perceber isso seria interpretando as letras, mas a dupla consegue traduzir tudo muito mais claramente em seu som. Sabe quando estamos vivendo um momento muito bom, mas algo de horrível acontece sem nenhum planejamento e nosso cérebro parece entrar em colapso e atuar no piloto automático até que tudo se conclua? Algum tempo depois, quando resgatamos a memória daquele período, tudo parece um grande borrão, trazendo de volta uma sensação física de perda de controle, mas com alguns flashes de esperança e boas lembranças que só pioram a situação ao lembrarmos do sofrimento que foi a transição entre a felicidade e a angústia.

No disco, é fácil ver a empolgação no início de Ex Teenager, um de seus singles, mas que se transforma em desespero antes mesmo de seu fim. Zonk é o início conturbado da busca por uma solução, por recuperar o controle, enquanto Fraction é puro torpor, quando a esperança chega em seu nível mínimo. Lá na frente, Rice & Bones, uma das mais belas faixas do ano, é um momento em que nada melhorou ainda, mas a sensação de que aquilo não é o fim do mundo já devolveu a razão a quem era pura emoção até poucos instantes. Tudo isso termina com Wanna Go To Rockaway Beach, faixa composta apenas por poucas notas no piano, como trilha do amanhecer após uma grande guerra. É quando percebemos que aqueles 33 minutos, que passeiam por tantas sensações diferentes, passaram muito rápido e não foram suficientes para processarmos o que acabamos de presenciar.

Todos esses sentimentos podem ser incorporados a diversas situações e é isso que faz a banda tão especial. Em Numerals, conseguiram incorporar suas melhores características que vinham sendo trabalhadas em suas últimas gravações, contendo duas minuciosamente trabalhadas faixas que são o carro chefe de mais fácil digestão do disco, Ex Teenager e Rice & Bones, e outras que quebram qualquer expectativa sobre o que é o trabalho da banda e como se insere em um gênero específico. Mesmo entre as faixas mais tradicionais, como a já citada que abre o álbum, a estrutura é mexida e ela já começa praticamente com o refrão, não dando tempo para uma construção de expectativa sobre o que vamos ouvir.

Disco Doom é uma daquelas bandas que parecem responsáveis por um trabalho mais nobre do que nossa própria compreensão, elevam a arte ao nível da pura expressão que completa seu ciclo com a interpretação do receptor, qualquer que seja ela. Isso é também seu maior pecado, o que torna o disco menos acessível, mais difícil de ser lembrado e que praticamente te implora para ser ouvido por inteiro. Numerals é como o momento que retrata, um borrão de desconforto e beleza extrema em nossa memória musical.

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Autor:

Nerd de música e fundador do Monkeybuzz.