Resenhas

King Gizzard & The Lizard Wizard, Mild High club – Sketches Of Brunswick East

Bandas australianas gravam disco caótico em conjunto

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Ano: 2017
Selo: ATO
# Faixas: 13
Estilos: Psicodelia, Rock Psicodélico, Rock Alternativo
Duração: 37:26
Nota: 3.5
Produção: Stu Johnson

Vocês conhecem Brunswick East? Segundo consta, é um subúrbio chique e cool de Melbourne, Austrália. É também o berço dessas duas bandas, King Gizzard & The Lizard Wizard e Mild High Club. Este é o terceiro álbum que os dois grupos gravam em conjunto, apesar de Lizzard já possuir outros dez discos lançados. É assim, com essa aritmética meio confusa, que essa gente chega até nós e nos pede para escutarmos sua mais nova criação, Sketches Of Brunswick East, que, de leve, ainda cita o antologíco clássico de Miles Davis, Sketches Of Spain, de 1960. Quem estiver pensando, no entanto, que a praia sonora aqui pende para o Jazz, lamento informar que o estilo, ainda que esteja contemplado em alguns momentos, não é dominante. Tampouco dá para dizer se há prevalência de algum gênero musical sobre o outro, uma vez que a proposta do álbum parece ser: “ouça o caos”. Está tudo amarrado, bem feito, bem pensado, mas a impressão que temos é de um conjunto de retas paralelas que se tornam perpendiculares, se encontrando, se tangenciando, se cutucando em meio a este painel sonoro. Em alguns momentos das treze canções, os grupos oferecem pepitas sonoras consideráveis.

Este é um álbum complicado para ouvidos com formação em canções Pop. As estruturas são embaçadas, as faixas são interligadas e a Psicodelia é mais presente que o Jazz e os acertos vêm, justamente, quando os grupos conseguem forjar melodias ensolaradas de têmpera sessentista, como se tentassem emular criações de bandas como Zombies ou algo no gênero. Quando o objetivo é alcançado, caso da luminosa quarta faixa, Tezeta, a sensação é de estarmos num workshop de como compor e gravar músicas assim. O arranjo respeita a lógica, a melodia tem função preponderante e a doideira instrumental é posta sob controle. Em compensação, quando isso não acontece, o caos, mencionado no primeiro parágrafo, toma conta de tudo e fica difícil se concentrar, tamanho é o volume de influências que surgem de todos os lados.

A impressão que este tipo de trabalho dá é que há muito a dizer e pouco tempo – ou capacidade – para fazê-lo. A overdose de informações atrapalha a mensagem, tornando tudo bem confuso até para o mais aberto e receptivo dos seres. Teclados com timbres vibrantes, guitarras fazendo efeitos, baterias que mudam de andamento, canto de passarinhos, barulhos de água corrente, tudo isso habita os pouco mais de três minutos de The Spider and Me, que também tem um DNA sessentista submerso em meio à arquitetura da faixa, soando como se uma cançoneta linear fosse apossada por alienígenas gaiatos. O efeito final é outro ponto alto do álbum. Como é típico em trabalhos desse tipo, há várias vinhetas interligando as faixas. Aqui a onda é fazer três canções com o título do álbum de numerá-las, dando a elas caras totalmente diferentes. A II é a mais melodiosa.

A dobradinha Dust To Dawn On Lygon St./The Book funciona bem com dois exercícios de distorção dessa melodia Pop sessentista que permeia as canções mais lineares do disco. Enquanto a primeira segue a cartilha de forma pouco alterada, com vocais e instrumental doce, a segunda propõe uma alteração vigora, com distorções e um órgão Farfisa enlouquecido, que costura a melodia sempre que possível, além de um vocal totalmente subvertido por efeitos e coisações de estúdio. A caminho do fim, outras duas canções tangenciarão esse modelo: Rolling Stoned (como ninguém pensou nesse título antes?) e You Can Be Your Silhouette, esta última parecendo um sambinha bossanovista executado por habitantes do Mundo Médio.

No fim das contas, a impressão que fica é de que os grupos conseguem equacionar bem sua receita de influências e optam por caminhos quase sempre privilegiando a melodia e a estrutura das canções. Ainda que o desejo de modificação seja dominante, o bom senso acaba prevalecendo na maioria do tempo e o talento dos sujeitos na confecção de boas canções fica como impressão marcante. Um interessante e amalucado espécime musical.

(Sketches Of Brunswick East em uma música: Tezeta)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.