Resenhas

Ride – Weather Diaries

Veterana banda britânica retorna com ótimo álbum após mais de 20 anos

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Ano: 2017
Selo: Wichita
# Faixas: 11
Estilos: Shoegaze, Indie Rock, Dream Pop
Duração: 52:10
Nota: 4.0
Produção: Erol Alkan

Talvez você não lembre ou nem estava neste mundo no início dos anos 1990. Foi uma época sensacional para o Rock, tempo de renovação, experimentos, excelentes bandas e artistas. Parecia que havia gente criativa em toda parte, uma belezura só. Algumas formações ficaram retidas naquela primeira metade de década, seja pelo bem, seja pelo mal. Ride, um sensacional quarteto de Oxford, Inglaterra, iniciou sua trajetória em 1990 e, já havia pendurado suas chuteiras seis anos depois. Nesse espaço de tempo, influenciou muita gente, de Oasis a Radiohead, seja na abordagem das guitarras, no amor pelo Powerpop sessentista e pela falta de cerimônia em mergulhar de cabeça na Psicodelia e reinventá-la. No meio do caminho, ajudou a criar um gênero simpático a muita gente, o Shoegaze. Como às vezes acontece na música popular, Ride já era velhusco em quando silenciou. Seus integrantes dispersaram-se, sendo o guitarrista e vocalista Andy Bell o sujeito que mais ficou visível, seja à frente de sua outra banda, Hurricane # 1, seja assumindo o baixo no Oasis, a partir de 1999 e no Beady Eye mais recentemente.

É surpreendente que Ride retorne com um álbum de inéditas após mais de 20 anos de silêncio. Weather Diaries é esta novíssima cria, composta de onze belos espécimes. Engraçado notar como a banda ainda soa relevante e capaz de encantar. A alquimia guitarreira com teclados está à frente de tudo, os arranjos estão menos esparsos e viajantes, mas esta faceta experimental não foi deixada de lado, apenas está subentendida e assimilada. Afinal de contas, não dá pra ser experimental na mesma coisa por tanto tempo, certo? De qualquer forma, Bell e seu parceiro, Mark Gardener, estão completamente envolvidos nesta recriação/atualização do “jeito Ride” de fazer música e, no meio deste processo, conseguem o balanço perfeito entre passado e presente. Enquanto algumas canções falam de BrExit, outras filosofam à luz do dia. Lembra um pouco o mesmo loop temporal de Trainspotting 2, só que, ao contrário do filme, o álbum é ótimo.

O velho fã, incrédulo/cético, vai abrir mão de sua posição e derramar uma furtiva lágrima lá na faixa 9, Integration Tape. É uma vinhetona de quase dois minutos e meio, indiana, psicodélica, caleidoscópica. Até este ponto, ele terá segurado o sorriso em vários momentos. All I Want, com um uso malandro de vocalizações e teclados luminosos, certamente o fará sorrir por dentro, porém, a leveza e o talhe Pop clássico da canção o deixará meio ressabiado e esperando por mais provas. Home Is A Feeling, uma balada majestosa, que parece alguma gravação setentista recém-descoberta, testará seus limites de emoção, quase conseguindo dobrá-lo. As guitarras fluidas e oitentistas da hipnótica faixa-título e o clima de crescendo de Rocket Silver Symphony irão confundí-lo, enquanto a perfeição de violões/guitarras de Cali o porá quase de joelhos.

É ótimo que Ride não tenha optado por apenas recriar seus truques musicais, algo que, pelamor, já faria de Weather Diaries um álbum a ser celebrado, porém, Bell e cia desejaram oferecer seus retratos musicais atuais ao ouvinte/fã, que esperou tanto tempo. O processo é bastante semelhante ao que viveu Slowdive ao lançar seu novo inspirado álbum este ano, após um intervalo semelhante sem produzir nada. O clima é de reencontro sem nostalgia, de vontade de mostrar-se novo, vivo e interessante. Com as duas canções que fecham os trabalhos, as lentas e climáticas Impermanence e White Sands, nosso ex-cético fã, já estará com o rosto lavado em lágrimas daquelas que se costumava chorar gostoso no passado.

Ouvir este disco é como encontrar seu amigo querido de outros tempos, ouvir um monte de novidades e manter uma conversa com pouquíssimo espaço para lembranças, mas com aquele clima confortável de familiaridade e aconchego. Uma lindeza, gente.

(Weather Diaries em uma música: Weather Diaries)

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BOM PARA QUEM OUVE: Slowdive, British Sea Power, Real Estate
ARTISTA: Ride

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.