Resenhas

BNQT – Volume 1

Supergrupo indie estreia com ótimo disco retrô

Loading

Ano: 2017
Selo: Bella Union
# Faixas: 10
Estilos: Rock Alternativo, Soft Rock, Folk Rock
Duração: 42:39
Nota: 4.5
Produção: Eric Pulido

Vou adiantar algo pra você, querido/a/x leitor: não há uma única sonoridade nova em Volume 1, a estreia de figurões da música alternativa anglo-americana sob o nome de BNQT. E isso é totalmente intencional. Alex Kapranos (Franz Ferdinand), Jason Lytle, (Grandaddy), Fran Healy (Travis), Ben Bridwell (Band Of Horses) e Eric Pulido Midlake) decidiram unir forças há quase quatro anos, mas só agora tiveram tempo para finalizar este primeiro trabalho. São criaturas nascidas e amadurecidas nos anos 1970/80, devidamente influenciadas por gêneros musicais hoje caducos, como Glam Rock, Soft Rock ou Progressivo Pop, mas que eles incorporaram em suas respectivas bandas de uma forma mais ou menos discreta ao longo do tempo. Aqui e agora, livres de compromissos estéticos com a novidade total, eles se soltam nessa dezena de faixas confortáveis como meia velha e se revelam como dedicados fãs de formações que merecem reconhecimento por seus bons serviços prestados ao Rock Alternativo de hoje.

Electric Light Orchestra, 10cc e Crosby, Stills And Nash estão entre as fontes de inspiração mais abordadas, ainda que haja espaço para citações mais ou menos explícitas de sonoridades mais roqueiras de John Lennon e dos próprios The Beatles, especialmente do pós-1968. O motivo disso é muito simples: tais abordagens da Música Pop, como tudo no campo das artes, passou por várias filtragens e reavaliações, inclusive, tendo as bandas dos envolvidos como protagonistas neste processo. Quanto de CSN há em Band Of Horses? Quanto de ELO há em Grandaddy? Quanto de The Beatles há em Travis? Claro, a graça está em reapropriações e ressignificações e estas formações sempre fizeram isso, mas é divertido abrir mão do compromisso com o “novo” e se entregar a melodias que poderiam ter mais de 40 anos de idade, sem soar caricato e, de passagem, apresentar aos fãs os caminhos mais simplificados para nomes legais do passado que, mesmo à beira da sétima década de vida, criaram obras que teimam em desafiar a validade inferida pelos padrões capitalistas de arte.

Não vá pensando, no entanto, que o álbum é uma mera sucessão clichês manjados, porque não haveria visão menos precisa. É uma celebração divertida e sincera de influências em seus trabalhos. Como só tem gente talentosa envolvida, o resultado são dez ótimas canções, com charme e brilho próprios, capazes de cativar tanto a fãs dos grupos dos envolvidos, quanto das influências e da boa música, além de ouvintes ocasionais, vindos aleatoriamente. Não há egolatria, ou qualquer detalhe que fuja dessa visão divertida de trabalhar com o que gosta e com seus amigos. De acordo com nosso mandamento único para o sucesso musical, a existência de boas canções é o que importa e, bem, temos vários ótimos exemplos por aqui.

Duas melodias são especialmente iluminadas: Failing At Feeling, de autoria de Jason Lytle, mostra o amor que ele tem por ELO e os arranjos orquestrais de álbuns como Abbey Road, além disso, seus vocais estão muito parecidos com os de John Lennon. Trata-se de uma balada dilacerante, conduzida ao piano, com intervenções tristonhas de violinos e repetição mântrica do verso que dá nome à faixa, uma lindeza que não tem fim. A homenagem à escola Folk de CSN em Unlikely Force é outra pequena apoteose intencional, com violões, vocais harmonizados com cuidado, melodia linda e intervenções bem azeitadas de metais no meio da gravação, dando a certeza de conhecimento de causa e apreço pelo resultado do binômio original/influenciado. Tudo funciona. Além desses dois destaques, há o Glamzinho de L.A On My Mind, que poderia estar numa sobra de gravação de The Slider, clássico álbum de T.Rex; o Alt Country simpático de Tara e a crocante e enguitarrada Restart, outro flerte firme com o glamourizinho roqueiro do início dos 1970.

Volume 1 é um compêndio de ótimas canções, compostas e gravadas por bons sujeitos, dispostos a se divertirem enquanto dão uma folga de suas bandas. É revisita a um passado comum, cronológico, mas é audacioso como artefato de um presente livre de compromissos e pressões sistêmicas. BNQT é o Travelling Wilburys deste início de século. Ótima diversão.

(Volume 1 em uma música: Failing At Feeling)

Loading

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.