O que faz uma música Pop ser extremamente viciante? Há quem diga que a exaustiva repetição nas rádios provoca um consumo forçado que adentra em nosso subconsciente, dando esta impressão “chiclete”. Outros consideram que é um processo de composição baseado em um mecanismo estudado de tentativa e erro que fica cada vez mais preciso. Mas também pode ser tudo uma escolha de Deus, em que nós mortais não temos o menor controle, como dito no filme God Help The Girl, de 2014.
Seja como for, é muito curiosa a forma que cada artista passa, na procura de encontrar um indício que o leve à construção de uma música Pop perfeita. Desta forma, o trio londrino Kero Kero Bonito é um bom exemplo de como isso é um processo demorado e que não necessariamente acontece nos primeiros registros, mas, quando chega seu efeito, é arrebatador.
Bonito Generation é o primeiro disco de estúdio da banda, sucessivo a algumas mixtapes que funcionaram como ensaios para este grande momento. Misturando referências da música do novo milênio, como J-Pop, efeitos de videogame e muitos sintetizadores eletrônicos, este álbum consegue trazer melodias extremamente simples, o que não é sinônimo de um trabalho simplista. É fácil cair no senso comum de ver o projeto como algo fofo, mas isso deve ser encarado mais como um elemento da obra do que uma estética sonora. A banda traz à tona um grande laboratório de referências cujas combinações funcionam de diversas formas, seja como a trilha sonora de um anime moderno, uma propaganda com luzes epiléticas ou hits Pop bastante sólidos.
O despertar do disco é anunciado por Waking Up, uma divertida canção que conta com um mini Rap que se reveza entre versos em Inglês e Japonês, como em outros momentos do disco. Heard A Song tem um dos refrões mais pegajosos do disco, acompanhado por um arranjo simples e de brilho bastante intenso. Graduation pode aparentar ter uma letra bobinha, mas é justamente aí que somos surpreendidos com referências a The Wall, de Pink Floyd (“Hey teachers, leave the kids alone”), e até mesmo a um Trap simplificado.
Big City é um momento que dialoga muito com os anos 80, não só pelos sintetizadores mas por trazer um pouco do City Pop japonês à tona. Lipslap remete às estruturas rítmicas do House, lembrando até mesmo o duo Disclosure. O single Trampoline trabalha bem com um refrão explosivo e traz viva referências de aberturas de anime, como Sailor Moon ou Sakura Card Captors, que são fofos, mas mostram personagens de extrema força em seus episódios. Por fim, Hey Parents, a faixa mais simples do trabalho remete a um discurso bastante adolescente, reforçando a ideia de que, contrário ao que se espera, são bastante explosivas e ingênuas.
Assim, Kero Kero Bonito marca sua estreia em estúdio com um disco que revela de forma interessante uma grande compilação de músicas Pop bem estudadas e executadas. Pode ser que as referências orientais tragam alguma dificuldade para ouvintes menos familiarizados com este repertório, mas justamente a intensa familiaridade com Pop faz com que os integrantes nos entreguem um disco bastante acessível. Um trabalho de profundidade escondida em divertidas canções Pop com muitos raios laser, brilhantina e glitter.
(Bonito Generation em uma faixa: Big City)