O novo álbum do cantor e compositor carioca Brunno Monteiro,Duplo foi dividido em dois EPs, intitulados Lado A e Lado B. O lançamento do disco se deu desta forma, com um EP surgindo antes do outro com uma semana de diferença. Brunno argumentou que o motivo era por ter decidido abraçar várias influências em seu trabalho e mais que isso: por querer contemplar múltiplos estilos de composição e gravação, unindo Eletrônica, pós-MPB, música alternativa de várias vertentes e tudo mais. Tal estratégia me lembrou o lançamento de Love Is Hell, álbum de 2003 de Ryan Adams, que saiu em forma de dois EPs e depois surgiu como um CD completo, ainda que as canções não fossem tão diferentes em termos de influências entre si, o mesmo molde foi usado. Eram outros tempos, no entanto.
Duplo não é um álbum com duração de dois CDs, mas um trabalho convencional, dividido por influências e abordagens. Brunno obriga o ouvinte a se preparar para uma metade mais convencional, com banda e instrumental “normal” e outra, mais experimental, Eletrônica, sombria, surreal e “difícil”. São reflexões e impressões urbanas-existenciais de um integrante de um representante de sua geração. Aos 29 anos, vivendo uma cidade como o Rio de Janeiro, frequentando rodas de amigos artistas, participando de shows e assistindo apresentações, Monteiro nos oferece a trilha sonora deste seu mundo, algo que todo artista propõe a seu público, de forma mais ou menos inapelável. O problema está numa constante opção pela dificuldade, pela estranheza, pelo “Pop anti-Pop”. Veja, nenhum artista é obrigado a compor melodias fáceis ou convencionais, bem como não há, necessariamente, valor absoluto em criações deliberadamente difíceis, que mais parecem soar assim como um manifesto do que uma escolha estética.
O que quero dizer é que justamente a parte mais experimental, contida no Lado B, é a mais interessante aqui. Brunno se vale de uma abordagem eletrônica interessante e beirando o Lo-Fi para oferecer suas impressões. E, em meio a estas seis faixas deliberadamente complexas, destaca-se Chuva e Calor, com participação de Rafael Rocha. É quase uma canção caetanística, fase Cores e Nomes, comprovando o tanto que a geração de Monteiro deve à obra do velho baiano. Melodia linear bonita, arranjo minimalista que enfatiza o violão em meio aos blips e blops, a canção faz bonito. Desperto também tem qualidades, soando noturna e minimalista mas o nonsense engraçadinho de Ice Cream, com participação de Letícia Letuce Novaes derrapa feio na pretensão e no verso “You’re my ice cream, I’m your hot cream”.
Da parte Lado A, chama atenção a primeira faixa, Café Pedra de Gelo, com arranjo de cordas, Eletrônica Lo-Fi intencional e uma boa letra (“meu coração tem uma manada de elefantes”), enquanto Brunno canta com alguma influência de um Cazuza jovem e moderno. Também se destaca Nublado, talvez a melhor canção dos dois EPs, com bom trabalho de guitarras apitantes, baixo esperto e alternância entre silêncio psicótico e barulheira maluca. Percurso também é interessante em suas guitarras ambientes e na voz de Brunno em falsete.
Existe um risco muito grande na música Pop, o de que soar moderno apenas por soar. Esperamos que este não seja o caso deste novo trabalho de Brunno Monteiro. Há boas ideias, vontade de soar diferente da mesmice, ousar em arranjos e letras, mas parece que este desejo obstruiu o curso natural de várias canções, tornando-as chatas e forçadas.
(Duplo em uma música: Chuva e Calor)