Resenhas

Rodrigo Ogi – RÁ

Crônicas românticas do rapper ganham reforço e tornam-se trilhas sonoras do cotidiano

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Ano: 2015
Selo: Independente
# Faixas: 16
Estilos: Hip Hop, Rap
Duração: 42:00
Nota: 4.0
Produção: Nave Beatz

Ao final de Correspondente de Guerra, uma das melhores faixas do segundo disco de Rodrigo Ogi, conseguimos entender como seu processo de composição funciona. “Sinto que é como se tudo que eu visse, eu absorvesse, e isso me faz sentir possuindo várias impressões digitais, várias sombras… Eu confronto essas sombras e a inquietação disso me assombra” afirma o rapper nos derradeiros momentos da canção. Através de diversos atores, o rapper conseguiu criar histórias extremamente visuais e fluídas por conta de seu flow particular em Crônicas da Cidade Cinza (2011). Tudo isso é extrapolado em , um albúm mais ambicioso que explora novas possibilidades e o aproxima de outros estilos musicais.

Algumas brilhantes participações especiais de Thiago França, Juçara Marçal e Kiko Dinucci (todos do grupo Metá Metá, entre outros projetos pessoais compartilhados) contribuem para mudança. Todos são personagens que distorceram o conceito da música brasileira feita em São Paulo e tem suas particularidades transformadas em Hip Hop. Mesmo que não apareçam em todas as faixas, sua participação revela as intenções do rapper e mostram que o Hip Hop desejado é muito maior que o uso de samples. , A divertida Hahaha explora as novas vertentes da MPB enquanto 7 Cordas aproxima-se do Samba e Na Estação da Luz é um Rock criado para o choque das desiguldades sociais íntrinsecas à cidade. Além das próprias influências e da vontade de criar um álbum mais plural, tais escolhas passam também pelas rimas e contos de Ogi – suas composições ganham vida além da música e se transformam em “rádio novelas” envolventes.

Seja através de arranjos de sopro, corda ou percussão, o álbum como um todo passa a sensação de um organismo vivo – a trilha sonora verdadeira do que acontece na metrópole. Com arranjos feitos também por Daniel Ganjaman, a obra incorpora o espírito de banda e mostram a necessidade de uma seleção de músicos para acompanhá-lo ao vivo. é mais pessoal, carregado de interlúdios e monólogos no divã envolvidos em suas faixas. É nesses momentos que conseguimos enxergar Rodrigo verdadeiramente – além dos personagens e situações criadas/vivenciadas.

O rapper nunca escondeu seu fascínio por histórias em quadrinhos e isso torna-se ainda mais evidente em : Ponto Final coloca um matador de aluguel para caçar Ogi, Escalada é a analogia ao poder e ao capitalismo feita a partir das ações de um corretor de imóveis picareta, enquanto Chico Cicatriz (com flow de batida brasileira dos anos 1990) passa por conceitos como traição, cinismo e a resposta das ruas e da sociedade diante de ações perversas. Em cada faixa, coloca-se um personagem reagindo diante de ações versadas por Ogi – a trilha sonora para seus relatos nunca foi tão bem lapidada e traz o envolvimento pleno do ouvinte.

Isso ocorre por conta da produção riquíssima de Nave Beatz, que soube transformar tais arranjos em composições abertas, cheias de frescor e vida. Seu trabalho é também o de sound designer ao inserir elementos sonoros nos contos (barulhos de tiro, gritos e arrancadas de carro entre outros) para criar a atmosfera das narrativas de Ogi. Ouça, por exemplo, a trinca Trindade 1, Trindade 2 e Trindade 3 para entender que, sem as inserções de Nave, a atmosfera teria se perdido totalmente.

Virou Canção é de longe a melhor faixa do álbum, a sua grande balada, e tem uma das letras mais pessoais da carreira de Ogi. Apaixonante, a canção cheia de suingue e boas vibrações provavelmente irá alçá-lo para novos públicos e o sucesso. Se o ofício de um rapper assemelha-se ao de um cronista, Ogi pode ser considerado também um romancista. Suas histórias são sempre extremamente visuais, seus personagens críveis e reais na cidade de pedra que o paulistano vive. acaba enaltecendo as suas melhores qualidades ao colocá-lo diante de uma equipe estrelada e faz do disco o sucessor necessário a Crônicas da Cidade Cinza.

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BOM PARA QUEM OUVE: Notorious B.I.G, Thaide, Action Bronson
ARTISTA: Rodrigo Ogi
MARCADORES: Hip Hop, Ouça

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.