Resenhas

Sara Não Tem Nome – Ômega III

Jovem cantora mineira mostra grande habilidade lírica em seu denso primeiro álbum

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Ano: 2015
Selo: Independente
# Faixas: 12
Estilos: Folk Rock, Folk, Rock, Rock Experimental
Duração: 36"
Nota: 4.0
SoundCloud: /tracks/223330083

Sara tem sim um nome. E também sobrenome. Ela é Sara Alves Braga e encabeça o projeto Sara Não Tem Nome, que vem ganhando bastante atenção de público e crítica ao longo dos últimos meses. Essa mineira de apenas 22 anos tem se destacado na mídia musical brasileira principalmente pele autenticidade de sua música, que geralmente se constrói em pilares sólidos e simples feitos de timbres Lo-Fi e sonoridades bem intimistas.

Ômega III é seu inquieto e angustiante disco de estreia que, em doze músicas (que somam cerca de 36 minutos), cobre uma variedade impressionante de estilos e humores, que vagam desde um desdobramento de um Folk Rock à la She & Him (Dias Difíceis) até um Rock mais experimental (Carne Vermelha). Ainda há espaço nesse emaranhado para músicas que brincam com Rock Alternativo (Água Viva), MPB (Atemporal) e até mesmo algo mais etéreo (Ajude-Me) e psicodélico (Queda Livre). Há variedade suficiente para tornar o álbum arrojado sem perder sua coesão, talvez, resultado de uma incerteza jovial que serve na verdade como força propulsora da obra. No fim das contas, o que se sobressai aqui é a personalidade que Sara dá a cada uma de suas músicas bastante confessionais.

Todas essas referências se combinam geralmente em harmonias simples que geram uma sensação de leveza, ainda mais ao escutar a doce voz da jovem. O contraste vem, porém, quando Sara canta de forma poética sobre as agruras da contemporaneidade. Isolamento, melancolia, abandono e certo azedume imbuído de cinismo estão aqui representados por meio de letras espertas e bem arquitetadas, que usam recursos bastante interessantes e muito empregados na literatura, como a aliteração “O temporal há tempo passou/ Atemporal o tempo parou”, de Atemporal. O efeito conseguido nessa e em outras faixas é uma espécie de mantra, um cântico hipnótico que transforma o vocal não só num meio de passar a mensagem, mas também em mais um instrumento.

E, de fato, um dos pontos mais interessantes da obra é ver como Sara consegue criar suas densas histórias as transformando em uma poesia bem musical. É uma brincadeira com palavras que diverte não só a compositora, mas também quem ouve. Versos como “Você desconhecido, você sem nome, sem amigo/Você, não fique assim tão deprimido/O mundo não acabou/Só está meio decaído”, de Queda Livre, “A raiva me consome e eu perco a razão/ Em meio as escolhas, eu escolho a indecisão/Não me aguento mais”, de Dias Difíceis, ou ainda “Eu não sou ferro, não/Eu não sou de aço/Minha carne é fraca/Eu sou um fracasso”, de Carne Vermelha, mostram essas construções bem elaboradas e por mais sombrias e honestas que sejam, guardam nelas um aspecto lúdico.

Em sua primeira obra, a jovem cantora mineira impressiona não só pelo domínio lírico, mas também por uma proposta estética que se não foge dos padrões vigentes, tenta ao máximo tangenciá-los em busca de algo mais fresco, visceral. De maneira geral, o que mais chama atenção na obra da “indigente” Sara é sua capacidade manipular as palavras e torná-las potentes mesmo com uma entrega tão doce e às vezes comedida, de sua habilidade em dar forma a um universo caótico que todos nós podemos nos conectar e narrar uma jornada que chega a inevitável e trágica conclusão, We Were Born Dead.

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Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts