Resenhas

Thunderbitch – Thunderbitch

Projeto paralelo de Brittany Howard mergulha nas sonoridades garageiras

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Ano: 2015
Selo: Independente
# Faixas: 10
Estilos: Rock & Roll, Blues Rock, Garage Rock
Duração: 28:17
Nota: 4.5
Produção: Brittany Howard e Matt Menold
SoundCloud: /tracks/65000645

Algo que me incomoda bastante nas bandas surgidas dos anos 00 para cá é a obsessão pelos anos 1980. Tudo o que a humanidade fez em termos musicais, para esta gente, parece estar encapsulado naqueles dez anos, entre 1979 e 1989, como se a vida na Terra surgisse num big bang e durasse apenas esse tempo, acabando em seguida e recomeçando em 2000, para que esse pessoal empreendesse a missão sagrada de reinterpretar e – muitas vezes – apenas revisitar sem originalidade alguma, o que foi criado lá. Felizmente, Alabama Shakes não tem esse tipo de problema, ampliando seu espectro sonoro para as riquíssimas décadas de 1970 e 1960, resgatando toda uma Arca de Noé de sons e climas importantes demais para a boa música Pop. Brittany Howard, a abençoada voz dos “Shakes” parece ainda mais capaz de viagar no tempo em velocidade Warp, trazendo e levando influências mais prestigiosas ainda e ela resolve nos mostrar como faz isso, a bordo de seu novo projeto, Thunderbitch. Sem exageros, é uma das grandes coisas surgidas em 2015.

Veja, Brittany e Alabama Shakes fazem essa apropriação de referências mais amplas no tempo musical de forma bastante pessoal. Enquanto a banda transita feliz por sonoridades Blues e Rock sessentistas, com cuidado de pegar alguma dica do Wall Of Sound de Phil Spector, reempacotando tudo e gerando um caldo suculento já colocado à prova em dois discos irretocáveis, Howard – cá entre nós, responsável por quase todo o charme da banda – se sai com um disco raro – só existe em vinil e download – caindo de boca em híbridos Punk’n’Blues angulosos e extremamente libertadores, no sentido de plugar guitarras em amplificadores e tocar bem alto. Ela não está sozinha neste seu Thunderbitch, sendo secundada por integrantes de bandas da cena Rock de Nashville, como Fly Golden Eagle e Clear Plastic Masks, ocultos sob os pseudônimos de Matt Man, B Bone, ThunderMitch, Char Man e A Man , além de Thunderbitch, usado por Brittany como cantora e guitarrista principal.

São dez canções que totalizam menos de meia hora. Há momentos em que a imagem de Alabama Shakes surge forte como na bela e rural Closer, com guitarras superlativas, órgão vintage, andamento moroso e efeitos nos vocais, ou em Very Best Friend, que tem uma inequívoca levada “stoniana” do início dos anos 1970, que faz sorrir antes dos quinze segundos de canção. A abertura rascante de Leather Jacket também lembra a sonoridade maior que a vida que a banda oficial de Brittany pratica, com precipícios vocais, turbilhonamento de guitarras e teclas, tudo urgente, como se fosse a hora certa para tirar o proverbial pai da forca.

É nas surpresas que está o charme de Thunderbitch, o disco: I Don’t Care é uma porrada de menos de dois minutos, afobada, suarenta, perfeita em sua linhagem clássica de Rock’n’Blues de meados dos anos 1960. Falando na influência de tonalidades primais do Rock, a soberba I Just Wanna Rock’n’Roll é o que seu título promete, caótica, vociferada mas conduzida por um imperceptível piano ancestral, presente desde o início dos primórdios do princípio do estilo. Eastside Party também diz “alô” a uma cantoria rocker entremeada por palminhas marcando compasso, enquanto Wild Child desfila desenfreada por barulhentos um minuto e 42 segundos de duração, em carga total.

Talvez a melhor canção do álbum seja My Baby Is My Guitar, na qual Brittany consegue emular os vocais de Janis Joplin e Jimi Hendrix ao mesmo tempo, em algo raro de se ouvir, enquanto a banda ergue uma parede sonora malvada e suja, milhas de distância das tentativas limpinhas e seguras de se fazer Rock blueseiro perpetradas por muita gente considerada genial hoje em dia. Thunderbitch, disco e banda, tudo junto, é um passo dado no caminho da autenticidade na música dos nossos tempos, sem exagero. É genuíno, irresponsável, relevante, ressonante, importante e faz sorrir, tudo na hora certa, nos devidos lugares. Brittany Howard – guardem esse nome, senhoras e senhores.

Thunderbitch – My Baby is My Guitar

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.