Resenhas

Willis Earl Beal – Nocturnes

Novo álbum do cantor e compositor americano é triste e elegante ao mesmo tempo

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Ano: 2015
Selo: Tender Loving Empire
# Faixas: 12
Estilos: Neo Soul, Lo-Fi, R&B Indie
Duração: 63:06
Nota: 3.5
Produção: Willis Earl Beal

De uns anos para cá, Willis Earl Beal serviu ao Exército americano, trabalhou como segurança noturno, morou em várias cidades americanas, dormiu na rua, casou, separou e gravou quatro discos. Sua voz é boa, de acento Soul inegável, mas ele está longe de se enquadrar em categorias estanques como gêneros musicais. Willis parece ser aquele tipo de pessoa que se expressa melhor através da arte, no caso específico aqui, por meio de desenhos e canções. Começou a carreira no fim da década passada, distribuindo flyers e CD-Rs em todos os lugares possíveis, enquanto compunha e gravava freneticamente em casa. As coisas começaram a mudar quando ele começou a chamar atenção da mídia especializada e lançar suas gravações caseiras e desenhos, numa espécie de pacote multimídia feito à mão, chegando a disputar uma vaga no programa X-Factor, perdendo nas eliminatórias. Em 2012, ele assinou contrato com um selo independente e começou sua carreira oficialmente.

Nocturnes é um disco conceitual, suas canções foram compostas e cantadas como se fossem lamentos para noites insones, vividas por Willis após o fim de seu breve casamento. Se você está por baixo, amigx, a audição das doze músicas podem te levar ao mais subterrâneo dos buracos underground sob a Terra. Para amplificar o clima de desolação urbana/uivando para a Lua, Willis escolheu o mínimo acompanhamento possível para sua voz, o que significa falarmos de arranjos com apenas sintetizador ou guitarra para servir de contraponto ao registro elegante do rapaz. A impressão que temos é a de uma pessoa arrependida, olhando a janela e vendo as poucas luzes noturnas dos carros se movendo ao longe, sem muita direção, enquanto procura imaginar em qual delas seu amor está, se pensa nele, se lembra dele, se sofre da mesma forma que ele. É dolorido, sim, mas alcança níveis altos de beleza, ainda que a ideia não seja exatamente original.

A abertura com Under You, como o título já anuncia, é o registro de uma pessoa literalmente arrasada, voando no chão, sem qualquer perspectiva de existência, a não ser pelo perdão da amada, pelo retorno à sua posição de outrora, não sendo possível outro futuro. Willis canta arrependimento em todas as canções do disco, escapando da previsibilidade em pequenos detalhes, como o vocal que ele registra em Like A Box, beirando um Ian Curtis contemporâneo e interracial. O acompanhamento também reflete a mudança rumo ao Pós-Punk, através de uma batida aleatória e um sintetizador intencionalmente monocórdio, que ruma em direção à noite, sem qualquer vontade de ver alguma luz. Em Lust, a faixa seguinte, assovios ecoam no canto da sala, enquanto um violão solitário tenta emergir do mar de sintetizadores que compõe a desolação da paisagem.

Há alguns momentos em que a tristeza e o arrependimento de Willis conseguem transmitir esperança, caso de No Solution, que confronta a parede acrílica de teclados com a voz onipresente, que surge de todas as partes, como se lutasse para ser ouvida em meio a uma avalanche de ruídos. Say The Words, com um piano etéreo e andamento que se aproxima vagarosamente de uma canção com têmpera Soul mais clássica, também mostra uma vulnerabilidade mais humana no lamento de Willis. Survive é outro destaque, justamente por incorporar mais elementos estranhos ao que esperamos, neste caso, algumas inflexões Synthpop, mostrando que nosso amigo, apesar da tristeza total, não descuidou de contemplar uma paisagem urbana ampla e convincente em seu álbum.

Nocturnes é muito, muito triste e mostra que Willis Earl Beal é um cara prolixo, mas sabe o que está dizendo. Não teve qualquer receio de tirar o coração do peito e colocá-lo nestas canções, que nos fazem até torcer para que sua esposa o receba de volta nesta vida, que, sabemos bem, às vezes pode tornar-se tão cruel quanto ele canta.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.