Resenhas

Active Child – Mercy

Segundo de Pat Grossi consegue extrapolar convenções de sua carreira e traz vocais poderosos surpreendentes

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Ano: 2015
Selo: Vagrant Records
# Faixas: 10
Estilos: Chillwave, Ambient Music, Dream Pop
Duração: 36:00
Nota: 4.0
Produção: Van Rivers

Poucos instrumentos conseguem ser tão relaxantes e etéreos quanto uma arpa. O imaginário de seu timbre nos remete sempre a figuras angelicais, deuses gregos e desprendimento – é fácil se perder quando a ouvimos e, talvez pela sua falta de presença na música atual, chame bastante atenção quando percebida. O problema reside no limiar entre a percepção do belo e do monótono, algo bastante subjetivo que felizmente tende à positividade em Mercy, segundo disco do compositor Pat Grossi, mais conhecido como Active Child.

Assim como em seu primeiro trabalho, You are All I See (2011), ou seu último EP, a arpa tem um papel fundamental nas composições, assim como o piano, outro elementos indissociável a Pat. Podemos entender esse papel em faixas como Never Far Away, R&B suingado, romântico e típica música para momentos bastante sensuais – nela, a arpa aparece de fundo como um elemento para nos colocar mais perto dos sonhos e nos fazer duvidar da realidade. Ao mesmo tempo, percebemos como as raízes da composição de Active Child são a cama para uma voz que se revela belíssima nesse disco e ainda dão espaço e base para que outros elementos ganhem mais destaque na produção.

Podemos atribuir o papel do produtor Van Rivers (de Fever Ray e Matthew Dear) determinante no processo, como o próprio Pat afirmou em entrevistas recentes. “Ele me exigiu de meus vocais como ninguém havia feito anteriormente” e realmente nunca havíamos o colocado em patamares tçao elevados como ocorre em Mercy: o cantor não deve em nada a outros nomes reconhecidos do meio, como James Blake, How to Dress Well ou Rhye. Logo, a sua música parece muito mais bem produzida, densa e cheia de instrumentos diversos que tornam seu segundo disco bonito e menos previsivél. A faixa de abertura 99 é de uma maturidade ímpar e agradaria aos ouvintes de rádios focados em músicas “easy listening”.

A faixa título, por exemplo, quase derrete em nossos ouvidos e toda a sua eleborada composição em texturas propicia deleite instântaneo, apesar de sua levada de R&B dos anos 1990 ser bastante usual. A viagem ao tempo parece ser a diretriz que Active Child busca neste disco, enquanto tenta jogar elementos próprios que ele mesmo considera instrínsecos ao seu trabalho. Midnight Swin foge dessa obviedade e nos coloca no meio de uma trilha-sonora para um universo particular de Pat que o fez alçar ao ponto em que se encontra na carreira: reconhecido e observado. A faixa trabalha com somente o piano e a arpa, e traz todos os toques angelicais que seriam perfeitos para um jogo de videogame como Legend of Zelda: Ocarina of TIme e seu templo da luz.

Inegavelmente, Mercy é extremamente bonito por transitar entre a delicadeza e a cadência para, em outros instantes, passar empoderamento e crescimento, justamente pela voz aveludada e melancólica de Pat. Stranger o traz perto da música Eletrônica e empolga em sua construção, Temptation volta-se para a simplicidade com vocais ainda mais impressionantes do cantor e uma linha de guitarra sexy como poucos momentos de sua carreira enquanto These Arms o colocará no radar de outros produtores em busca de ternura em suas produções.

Garante-se assim um nicho que Active Child divide com outros artistas contemporâneos que tem como grande triunfo a voz. Isso ocorre ao mesmo tempo em que se evidencia uma produção épica e grandiosa – Lazurus é provalvemente o momento mais expansivo de sua carreira -, feita com acordes bem trabalhados e um cuidado estético que traz o músico mais perto de canções vendidas para trilhas de publicidade (Too Late poderia ser uma composição para um filme da Disney e tocado na premiação do Oscar). Pode colocá-lo em palcos maiores e o faz soar menos como um produtor de quarto (“bedroom producer”) e mais como um artista completo ainda que imperfeito. Bonito do começo ao fim e limitado a estados de espírito coincidentes com a melancolia e a calmaria, Mercy é o disco menos viajado de sua carreira e também o mais sincero e poderoso.

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Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.