Resenhas

Laura Marling – Short Movie

Cantora e compositora inglesa dá um passo à frente na carreira com este álbum

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Ano: 2015
Selo: Ribbon Music
# Faixas: 13
Estilos: Folk, Folk Rock , Folk Alternativo
Duração: 50:08min
Nota: 4.5
Produção: Laura Marling, Matt Ingram, Dan Cox

Para entender exatamente o significado deste surpreendente novo álbum de Laura Marling, precisamos voltar um pouco no tempo. Laura, 25 anos, declarou em 2013, após lançar quatro belos álbuns, que estava cansada da indústria musical e do próprio ofício de fazer música. Deixou sua Inglaterra natal, onde era uma espécie de rainha-musa de algo conhecido como “Nu-Folk” e foi para os Estados Unidos cair na estrada. Ela tinha em mente a necessidade de receber uma espécie de batismo de fogo das adversidades, passando dois anos trabalhando como garçonete e viajando pelos cafundós da América. Pode parecer um movimento pensado que reproduz o que parecia ser normal há 40, 50 anos, quando artistas precisavam abandonar o conforto de seus lares de classe média para apanhar da vida e endurecer os corações na poeira da estrada. Com Laura, o efeito foi devastador. E benéfico.

Short Movie, seu quinto álbum, é o produto direto desse período de insegurança sobre sua relação com a música, suas experiências fora dela e a digestão disso tudo. Se Marling lembrava artistas como Joni Mitchell em seus álbuns anteriores, muito por conta da delicadeza de arranjos e dedilhados de violão, aqui a cantora e compositora canadense ainda é sua musa inspiradora maior, mas a sonoridade aponta para algo equivalente acontecido na carreira de Joni, quando ela abandonou o Folk mais tradicional – ou embebido em águas psicodélicas – para rumar em direção ao Rock e ao Jazz, em meados dos anos 1970. Laura Marling, para citar Novos Baianos, caiu na estrada e perigou ver de perto a inconstância das coisas. Emergiu dela com um ramalhete musical agridoce e raivoso de primeira categoria. Tentou gravar o álbum em Los Angeles, mas precisou retornar a Londres e mexer em todas as doze canções para encontrar a forma ideal.

O efeito é de uma tempestade prestes a cair. Laura não abre mão das sonoridades acústicas, mas insinua – e às vezes confirma – alterações de ritmo e a placidez vai pelos ares. Não bastasse esse clima de contenção intencional e consequente libertação, as canções são duras, entristecidas, com olheiras e sono advindo de noite mal dormida. Walk Alone, por exemplo, é exatamente assim, com Laura dedilhando uma guitarra elétrica, cercada por cordas e baixo, que tramam tomar conta a despeito dos vocais tristes e agudos, algo que não chega a acontecer, mas a sensação de expectativa é o ponto mais importante aqui. A voz canto-falando de Strange, a canção seguinte, é totalmente mitchelliana, principalmente se pensarmos em canções como Coyote, na qual Joni adotou o mesmo jeito de cantar. Laura vai pelo mesmo caminho, com violão percussivo, baixo e bateria sutis, com voz anormalmente grave. Don’t Let Me Bring You Down é uma canção dylanesca com pegada mais enguitarrada e roqueira, algo refrescante e belo, mostrando o quanto a moça está à vontade com seu novo parâmetro.

Laura oferece alterância de números acústicos belíssimos, como Easy, que é anormalmente bela, triste, cheia de violões e cellos, como se ela fosse um Bob Dylan feminino e amargurado aos 20 e poucos anos de idade. Também proporciona híbridos eletroacústicos como a faixa título, toda deserto, toda visão de gente querida indo embora, False Hope, imersa em paisagens cinzentas com instrumental que vai encampando os vocais aos poucos ou a bela Gurdjeff’s Daughter, rapidinha e triste na mesma proporção, com sutis mudanças de tom, bela, inconsolável.

Laura Marling fez seu melhor disco até agora. Short Movies tem história, estofo, melodias impressionantes, letras sensacionais e sinceridade. E Laura só tem 25 anos. Maravilha.

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BOM PARA QUEM OUVE: Luluc, Joni Mitchell, Feist
ARTISTA: Laura Marling

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.