Resenhas

Lieutenant – If I Kill This Thing We’re All Going To Eat For A Week

Projeto paralelo de Nate Mendel (Foo Fighters) revisita o passado musical de Seattle

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Ano: 2015
Selo: Dine Alone Records
# Faixas: 9
Estilos: Rock, Rock Alternativo, Indie Rock
Duração: 38:29
Nota: 4.0
Produção: Toshi Kasai

Nate Mendel é baixista de Foo Fighters desde o início de suas atividades, lá em 1995. Antes disso, fornecia a pavimentação sonora para uma outra banda de Seattle, menor e bastante promissora: Sunny Day Real Estate. Quando optou por entrar no projeto de Dave Grohl, Mendel fez uma aposta de baixo risco posto que era impossível que o novíssimo grupo naufragasse. Talvez ele jamais tenha imaginado que Foo Fighters nas duas décadas seguintes seria sinônimo de Rock para uma maioria mundial de pessoas que oscilam entre o conhecimento superficial do estilo ou pelo desconhecimento quase absoluto dele. De qualquer forma, a conta bancária de Mendel viveu momentos melhores desde então e não há nada errado nisso. Uma olhada mais acurada para o rapaz, entretanto, mostra um cara sério, tímido até, meio desconfortável com toda a badalação que se ergueu em torno de Foo, muito mais pela prevalência de Grohl como homem de marketing que por qualquer mérito sonoro dos músicos. Aliás, pergunte para os fãs casuais do quinteto se eles são capazes de nomear todos os integrantes da banda. Né?

Sendo assim, como um típico camisa 8 no futebol, Mendel gravou um álbum solo, If I Kill This Thing We’re All Going To Eat For A Week e adotou um pseudônimo. Lieutenant. Chamou uma galera de contemporâneos, entre eles Page Hamilton (Helmet), Joe Plummer (The Shins), Chris Shiflett (companheiro de Foo Fighters) e o ex-vocalista de Sunny Day Real Estate, Jeremy Enigk. Não é surpresa detectar, logo aos primeiros acordes da primeira canção do álbum, com o bandeiroso título de Belle Époque, que essa galera encontrou um caminho seguro para revisitar seu passado, especialmente Nate, um dos responsáveis pela aliança entre sensibilidade e riffs de guitarra, lá no início da década. O que sai pelos sulcos imaginários do disco é uma melodia bela, plácida, com vocais em tom menor, agridoce, chiaroscuro, contrastando doçura e sofrimento, típicos daquele adolescente que todos temos dentro de nós e que se recusa a ir embora. O álbum todo é sobre isso, ainda bem.

Como se fosse um sujeito que pega o carro dos pais pela primeira vez em décadas e faz um escrutínio sobre os lugares que temos pra ir, hoje, depois de tanto tempo. É o tema que conduz The Place You Wanna Go, com melancolia em dose certa, combinando bem com a elegância de um amálgama de guitarras e teclados, tudo bem bonito e triste. Believe The Squalor, o primeiro single a surgir, também vai pela mesma onda nublada e contemplativa, enquanto Rattled vem com teclados, bateria marcial e vocais soterrados em efeitos, tudo em tonalidades sépia que se misturam ao amarelado do tempo num álbum de formatura qualquer. Pouco depois a canção engata numa ancestral levada aerodinâmica que desemboca em refrão barulhento e sujo, nada mais típico e exorcizante. A adorável Prepared Remarks vem com uma surpreendente levada que poderia lembrar Dreams de Fleetwood Mac ou qualquer coisa californiana dourada dos anos 1970, dessas que os integrantes poderiam lembrar de alguma viagem com pais naquelas caminhonetes com acabamento de madeira.

Mais popices nebulosas chegam com Some Remove, com teclado imitando sonoridade Fender Rhodes e guitarras harmoniosas, passando logo para a simpática Sink Sand, melodiosa e travada, dando a impressão que teremos uma explosão de refrão em guitarras pra todos os lados, algo que a canção evita sabiamente. Artificial Limbs tem cara de canção subterrânea de Seattle, daquelas que poderiam ser uma sobra de estúdio do próprio Sunny Day Real Estate, cuja sonoridade serve de base para a empreitada de Nate e sua turma. O final com Lift The Sheet novamente alterna tristeza e conformidade, leveza e choro, tarde de chuva olhando a rua lá embaixo e desejo por uma manhã de sol, longe dos problemas.

A estreia de Lieutenant é melhor que quase toda a produção de Foo Fighters, talvez executando os dois primeiros álbuns. É bela, bem gravada, bem produzida e tem uma grande dose de sinceridade, algo que faz muita falta no Rock atual. Nate Mendel deve estar sorrindo à toa, finalmente. Ouçam com o coração aberto.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.