Resenhas

Simple Minds – Big Music

Novo álbum do grupo escocês recupera glória e vigor de seus primeiros trabalhos

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Ano: 2014
Selo: Caroline
# Faixas: 12
Estilos: Rock, Rock Alternativo, Pós Punk
Duração: 51:48min
Nota: 4.5
Produção: Steve Osborne, Andy Wright e Steve Hillage

Se fizermos um exercício de desconstrução, encontraremos várias versões do grupo escocês Simple Minds através dos tempos: a promissora banda da virada dos anos 70/80 do século passado, fluente na fusão do Art Rock com o Pós Punk; a bem sucedida formação que dava shows em estádios lotados emulando a dramaticidade/messianismo de U2; o decadente e nostálgico conjunto que viveu do passado e da nostalgia de fãs de meia idade, retrato tirado entre os anos 1990 e a primeira metade da década de 2000. Apesar deste anti-clímax histórico, alguns sinais de reação e de busca pela melhor forma artística por parte da banda foram notados a partir dos dois álbuns anteriores a este, Black Love 050505 (2005) e Grafitti Soul (2009). O objetivo, finalmente, foi atingido agora, neste sensacional Big Music.

Com a presença de integrantes fundadores ou dos primeiros e gloriosos dias – no caso, Jim Kerr (vocais), Charlie Burchill (guitarras) e o baterista extraordinário Mel Gaynor -, Big Music é uma inteligente manobra da banda, que pode soar saudosista, afinal, o disco recupera vigorosamente a sonoridade aveludada dos primeiros tempos do grupo, justamente a maior fonte de inspiração para uma legião de bandas e artistas contemporâneos, que fazem de tudo para soarem como se estivessem em 1981, 1982. E nesse tempo, amigos, Simple Minds era um dos grupos que davam as cartas neste terreno de Synthpop e derivados. Fazia isso com elegância extrema, mesmo quando rumou sutilmente para uma sonoridade maior e mais grandiosa, que culminou com o sucesso de clássicos como (Don’t You) Forget About Me e Alive And Kicking, por volta de 1985.

Chega de falar de 30 anos atrás. Big Sound vai te provar que é possível para o Rock soar maiúsculo e dançante, muscular e sutil, dramático e feliz, simultaneamente. Kerr e Burchill continuam afiados como compositores e mantém o arcabouço sonoro em dia com o que há de melhor na música de hoje, sem perder de vista as origens. A abertura com Blindfolded já configura um nocaute técnico ao ouvinte que desdenhou das capacidades de uma “banda veterana” fazer som tão relevante e legal. São cascatas de teclados e programações de bateria, guitarras estridentes, todos devidamente misturados numa mixagem e produção inteligentes, no ponto certo. A sequência traz Midnight Walking, com progressões de bateria e teclados, com aquela impressão de estarmos num anoitecer gelado em algum lugar, dirigindo em alguma autoestrada, rumo a lugar nenhum, apenas pelo prazer de conduzir o carro. Honest Town é uma arrepiante homenagem de Jim Kerr à sua mãe moribunda e à cidade natal de ambos, Glasgow. A letra fala dele levando-a para um último e emocionante passeio de carro pelas ruas e praças tão familiares a ambos, numa espécie de balanço de perdas e danos e antecipada despedida diante do inevitável fim. Kerr compôs a canção com Iain Cook, do grupo conterrâneo Chvrches.

A faixa título vem em seguida, grandiosa como o nome sugere, melodiosa, com especial destaque para a bateria de Gaynor, que forjou uma levada característica nos anos 1980, pesada, marcial, mas cheia de criatividade e potencial dançante. Human é outra canção em que os teclados de Andy Gillespie se dobram e confundem com a guitarra de Burchill, fazendo a cama para a voz de Kerr – ainda em forma – planar soberana pelo refrão grudento e tridimensional. Blood Diamonds é outra parceria com Cook e serve como uma pequena passarela para Burchill exibir técnica e inteligência no uso da guitarra tanto como instrumento principal quanto produtora de pequenos efeitos na massa sonora.

Let The Day Begin é outro exemplo de canção marcial, enguitarrada, ritmada, pertencente a um inconsciente coletivo dos que apreciam aquela música que não existe sem ser chamada de “moderna”, mesmo que tenha 30 anos ou 30 meses. Concrete And Cherry Blossoms é outro momento dourado da dupla Gaynor/Burchill, mostrando o quanto o estúdio foi bem aproveitado, na busca de uma sonoridade capaz de honrar o título do álbum. Imagination casa efeitos de percussão eletrônicos com bateria de verdade e velocidade em busca de algum sonho perdido da noite anterior. Kill Or Cure é mântrica, percussiva e dramática, mas com baixo suingado e ritmo dançante inesperado. Broken Glass Park é misteriosa e remete aos instantes anteriores ao raiar do dia, quando fazemos o inventário da noite anterior. Spirited Away fecha a procissão de canções, com uma levada sutil e voz sussurrada de Kerr, como se estivesse no fim das forças, mas ainda capaz de fazer-se ouvir graciosamente.

Big Music é uma inesperada maravilha dessa coisa chamada Rock’n’Roll, que permite o retorno de uma grande banda, que soa moderna, promissora e interessante. Este é o melhor álbum que Simple Minds lança desde New Gold Dream 81-82-83-84 (lançado há 32 anos), algo que jamais poderíamos imaginar. Não deixe de ouvir se o seu negócio é música sempre moderna, feita para dançar, sonhar e pensar na mesma medida, com competência, bons músicos e boas ideias.

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BOM PARA QUEM OUVE: CHVRCHES, The Killers, Interpol
ARTISTA: Simple Minds

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.